TSE aprova distribuição proporcional de recursos a candidaturas negras. Nova regra, porém, será válida a partir de 2022. Movimento negro defende aplicação já no pleito deste ano
Representantes do movimento negro entendem que os partidos devem cumprir este ano, e não em 2022, a distribuição de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) proporcional ao número de candidatos negros registrados pelos partidos para disputar as eleições. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, nesta terça-feira (25), em favor da medida, mas as novas regras irão valer somente para as eleições de 2022.
Pela decisão, o critério de distribuição proporcional também deve ser observado sobre o tempo gratuito de rádio e televisão a candidatos negros, sejam mulheres ou homens. A divisão igualitária ainda deve ser regulamentada por resolução do tribunal. Relator do processo, o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, destacou a decisão em suas redes sociais como “um momento muito importante da vida do tribunal e do país”.
“Hoje, afirmamos que estamos do lado dos que combatem o racismo. Estamos do lado dos que querem escrever a história do Brasil com tintas de todas as cores”, escreveu Barroso. O entendimento partiu de um pedido de consulta de autoria da deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ). Pré-candidata à prefeita pelo Rio de Janeiro, Benedita questionou se os incentivos às candidaturas femininas, já previstos na legislação, não poderiam ser reservados especificamente para candidatas negras.
A deputada também indagava ao tribunal se metade das vagas e da parcela do fundo especial poderiam ser direcionados a essas candidaturas. A resposta dos ministros, por 6 votos contra 1, foi a proposta de distribuição de recursos e do tempo de propaganda eleitoral. O ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto foi o único a responder negativamente ao pedido de consulta. De acordo com informações do TSE, o ministro disse que caberia ao Legislativo deliberar sobre essas questões.
Votos vencidos
O mesmo entendimento também pesou sobre destinação de 30% do FEFC e do tempo de propaganda a candidatos negros, questionados por Benedita. O tribunal entendeu que seria uma espécie de “cota”, que caberia de resolução ao Congresso Nacional.
Até a quarta-feira (20), o julgamento dava a entender que a distribuição igualitária valeria já para as eleições municipais deste ano, conforme o voto dos ministros Barroso, Alexandre de Moraes e Edson Fachin. Os três, no entanto, tiveram o voto vencido por Neto e os ministros Og Fernandes, Luis Felipe Salomão e Sérgio Banhos. Os quatro consideraram que a decisão “causaria surpresa no ambiente partidário e atrapalharia o processo de registro de candidaturas”.
O presidente do TSE minimizou a decisão, afirmando que “o adiantamento dos efeitos não reduz a importância do que fizemos: com atraso, mas não tarde demais, empurramos a história na direção da justiça racial”, pontuou.
Vitória do movimento negro
De fato, logo após a votação, o entendimento era comemorado nas redes sociais. A deputada Benedita da Silva considerou o dia como “histórico”. A também deputada federal Talíria Petrone (Psol-RJ) destacou que essa era uma “vitória da luta do povo negro”. “É preciso avançar em políticas antirracistas que deem conta da representatividade nos espaços de poder”, escreveu Talíria.
Uma pesquisa da FGV Direito mostrou que nas eleições à Câmara dos Deputados, mesmo as mulheres negras sendo 12,9% das candidaturas, elas receberam apenas 6,7% dos recursos. Diferente das mulheres brancas, que representavam 18,1% e receberam o montante proporcional. E mais desigual ainda dos homens brancos, que eram 43,1% dos candidatos e receberam 58,3% do dinheiro dos partidos.
Proporcionalidade desde já
Pelo Twitter, o Instituto Marielle Franco, responsável pela plataforma Pane Antirracista – que fazia campanha pela distribuição igualitária –, quase 10 mil pessoas e 150 organizações se uniram para pressionar o TSE pela mudança. O instituto agora reivindica que “os partidos não esperem a Justiça mandar e respeitem a proporcionalidade desde já”.
“São 520 anos de atraso! Não queremos esperar nem um dia a mais! Os partidos devem se comprometer desde já com políticas internas antirracistas!”, cobrou a instituição.
A Coalizão Negra Por Direitos, que reúne 150 organizações e coletivos do movimento negro, também frisou que “a decisão altera a estrutura racista de partidos políticos. Mas, para que seja mais rápido, esperamos que os partidos não esperem a justiça mandar e antecipe a nova regra, deixando as eleições mais justas”. A Uneafro lembrou ainda que apesar da decisão histórica, “a luta não acaba aqui. É preciso continuar pressionando porque seus efeitos só serão aplicados pelo tribunal em 2022”.
Nas últimas eleições municipais, apenas 32 mulheres negras foram eleitas. Há três meses do novo pleito, o mandato será fechado com uma a menos, após a execução política da vereadora Marielle Franco (Psol-RJ).
(*) Com informações do TSE
FONTE: REDE BRASIL ATUAL
FOTO: Tomaz Silva/EBC