Descoordenação política dificulta enfrentamento da pandemia no Brasil

48

Falta de padrão em testagem e tomadas de decisão desarticuladas comprometem o combate à covid-19 e enfraquecem decisões de flexibilização

Descoordenação nacional de políticas públicas dificulta enfrentamento da pandemia de covid-19 no território brasileiro e enfraquece decisões de flexibilização de distanciamento social. A avaliação é dos pesquisadores da Rede de Pesquisa Solidária que, em seu 13º boletim, mapeou informações sobre a testagem de covid-19 no Brasil, identificou diferenças entre os tipos de testes realizados e apurou imprecisão das informações apresentadas pelas Secretarias Estaduais de Saúde (SES)  de cobertura da testagem.

Segundo o boletim, o Brasil é o que menos testa entre os 20 países com maior taxa de óbitos. Está atrás da China, Estados Unidos, México, Peru e Turquia. Além de não realizar o volume necessário, tampouco consegue fazer o número suficiente para identificar a proporção de brasileiros que já manteve contato com o vírus. A lacuna de informação sobre a presença e circulação do vírus entre a população está na base da subnotificação de casos positivos. A média de positividade dos testes no País foi de 36% em junho de 2020, bem acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de até 5%.

Testes RT-PCR/Teste rápido/sorológico

Grande parte dos Estados torna público apenas o total de testes, sem classificação por tipo. Somente 14 Estados prestaram contas do número de testes realizado por RT-PCR (sigla em inglês de reverse-transcriptase polymerase chain reaction), que identifica com maior precisão as pessoas infectadas, e por testes rápidos (IgM) e sorológicos (Igc), que apontam quem já teve contato com o vírus e possui anticorpos, ambos utilizados no rastreamento e disseminação do vírus.

Testes RT-PCR/teste rápido/sorológico e número total de testes para os Estados que não diferenciam o tipo de teste realizado (por 100 mil habitantes)

Testes realizados nos Estados brasileiros

As plataformas oficiais das SES e os boletins estaduais apresentam dados muito diferenciados, o que, segundo o boletim, denota ausência de padrão nacional. Os Estados do Acre, Amapá, Goiás, Rondônia, Rio de Janeiro, Roraima, São Paulo e Tocantins não aparecem na tabela porque as informações sobre os testes realizados não constavam nas plataformas oficiais.Leia também:  PL das Fake News será votada na próxima terça-feira

Unidades Federativas e  informações sobre testes realizados

Positividade dos testes realizados no Brasil

A fim de avaliar a cobertura de testes realizados e como se comparam com a evolução da pandemia nos Estados brasileiros, foi estimada a porcentagem de casos positivos entre o total de testes realizados nos Estados brasileiros. Nesta estimativa, considerou-se o total de testes realizados, independente do tipo do teste, conforme informado pelas SES. A Figura 4 apresenta a positividade dos testes realizados na semana de 31 de maio a 6 de junho para todos os Estados brasileiros e também para todo o País. O Rio de Janeiro e Tocantins não estão representados nesta figura por não apresentarem dados de testagem no período de análise.

Como pode ser observado, o Estado de Minas Gerais apresenta mais de 100% de positividade, por isso o número de casos novos de covid-19 foi superior ao número de testes realizados na semana. Apesar da figura revelar informações importantes, segundo os pesquisadores, é preciso esclarecer que a ausência de informações atualizadas diariamente sobre os testes realizados nos Estados limita a capacidade de entendimento das oscilações dessas taxas. Pela Figura 4 também é possível verificar que somente o Distrito Federal apresentou uma positividade inferior a 10%, ainda assim superior à recomendação de 5% da OMS. A linha vermelha se refere à orientação da OMS de positividade (5%).

Positividade dos testes realizados nos Estados entre 31/5 e 6/6 (%)

Rede de Pesquisa Solidária é uma iniciativa de pesquisadores para calibrar o foco e aperfeiçoar a qualidade das políticas públicas dos governos federal, estaduais e municipais que procuram atuar em meio à crise da covid-19 para salvar vidas. O alvo é melhorar o debate e o trabalho de gestores públicos, autoridades, congressistas, imprensa, comunidade acadêmica e empresários, todos preocupados com as ações concretas que têm impacto na vida da população. Trabalhando na intersecção das Humanidades com as áreas de Exatas e Biológicas, trata-se de uma rede multidisciplinar e multi-institucional que está em contato com centros de excelência no exterior, como as Universidades de Oxford e Chicago.

A coordenação científica está com a professora Lorena Barberia (Ciência Política USP). No comitê de coordenação estão: Glauco Arbix (Sociologia-USP e Observatório da Inovação), João Paulo Veiga (Ciência Política-USP), Graziela Castello, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), Fábio Senne (Nic.br) e José Eduardo Krieger, do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da USP (INCT-InCor). O comitê de coordenação representa quatro instituições de apoio: o Cebrap, o Observatório da Inovação, o Nic.br e o InCor.Leia também:  OMS alerta: América Latina não atingiu pico da pandemia

A divulgação dos resultados das atividades é feita semanalmente por meio de um boletim, elaborado por Glauco Arbix, João Paulo Veiga e Lorena Barberia. São mais de 40 pesquisadores e várias instituições de apoio que sustentam as pesquisas voltadas para acompanhar, comparar e analisar as políticas públicas que o governo federal e os Estados tomam diante da crise. “Distanciamento social, mercado de trabalho, rede de proteção social e percepção de comunidades carentes são alguns dos alvos de nossa pesquisa. Somos cientistas políticos, sociólogos, médicos, psicólogos e antropólogos, alunos e professores, inteiramente preocupados com o curso da crise provocada pelo coronavírus no mundo e em nosso país”, define Arbix.

As notas anteriores estão disponíveis neste link

FONTE: GGN
FOTO: Governo do Estado de São Paulo /Flickr